terça-feira, 26 de julho de 2011

Vacina contra o HPV

Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) estimam em 20 a 40% a prevalência global do HPV na população de mulheres sexualmente ativas, sendo esperado um aumento anual de 300 milhões no número de portadoras do vírus ao redor do globo. Nos Estados Unidos, algumas bases de dados sugerem que 3 em cada 4 mulheres apresentarão a infecção pelo HPV em algum momento da vida. No Brasil, pesquisas mostraram que 12 a 20% das mulheres adultas com citologia cervical normal, sem sintomas nem lesões visíveis, são portadoras do vírus, facilitando a transmissão sexual do agente.

Uma vez que não existem técnicas para erradicar o vírus do organismo humano, as tentativas de evitar a progressão das lesões incluem desde ressecções cirúrgicas de parte ou de todo o colo uterino até cirurgias amplas com a retirada do útero, tubas, paramétrios e parte da vagina, no caso de o carcinoma já ter-se disseminado localmente. Logo, estratégias preventivas sobre o vírus e sua forma de transmissão parecem ser a maneira menos agressiva e mais custo-efetiva de abordar o problema.

No Brasil, o Ministério da Saúde recomenda a realização da colpocitologia oncótica (Papanicolau) anualmente a mulheres sexualmente ativas. Além disso, executa programas educacionais em nível nacional sobre a necessidade de consultas regulares ao ginecologista e práticas sexuais seguras e disponibiliza informações sobre o câncer de colo do útero, o HPV e outras DSTs. Porém, o governo brasileiro ainda não oferece a vacina contra o HPV na rede pública, deixando a estratégia preventiva sem um de seus componentes mais importantes.

Atualmente, existem duas vacinas comercialmente disponíveis: a quadrivalente Gardasil® (HPVs 6, 11, 16 e 18), da gigante farmacêutica Merck Sharp & Dohme, e a bivalente Cervarix® (HPVs 16 e18), da Glaxo Smith Klein. Ambas já foram aprovadas para uso, em mulheres de 9 a 26 anos, em diversos países, por agências de vigilância à saúde, como o FDA (Food and Drug Administration) americano e a ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) brasileira.

Com o potencial de reduzir 70% dos casos de câncer de colo uterino e 90% das verrugas genitais, essas vacinas são produzidas a partir de partículas chamadas VLPs (Virus Like Particles), obtidas por técnicas de engenharia biomolecular e cuja estrutura tridimensional é semelhante à cápsula do vírus, fato que deflagra a resposta imunológica pretendida. Estudo recente com 27 mil mulheres de 33 países mostrou que a vacina quadrivalente é eficaz em prevenir 99% das infecções persistentes e lesões de alto grau causadas pelos HPVs 16 e 18, os subtipos mais cancerígenos. Pesquisa envolvendo 18.700 mulheres com idade entre 15 e 25 anos mostrou eficácia semelhante da vacina bivalente. A proteção mostrou-se eficaz por 4 a 5 anos após a aplicação de 3 doses (0, 2 e 6 meses) em mulheres que ainda não tinham iniciado a vida sexual, e os efeitos colaterais têm sido relatados em menos de 1% dos casos e incluem dor discreta no local da aplicação e febre baixa.

Embora vários estudos tenham demonstrado eficácia e segurança, as vacinas contra o HPV não serão tão facilmente incluídas no Calendário Oficial de Vacinação do Ministério da Saúde. “A vacina tem um custo alto, o que dificulta o acesso universal”, diz a especialista em Doenças Infecciosas e Parasitárias, Tânia Mara Varejão Strabelli, da Universidade de São Paulo. De fato, uma única dose da vacina chega a custar U$S 140,00 junto aos fabricantes. No Brasil, clínicas particulares chegam a cobrar R$ 500,00 por uma única aplicação. Ainda assim, a procura pela vacina tem aumentado progressivamente em clínicas e laboratórios desde seu lançamento, garante Strabelli. Além do custo, outras questões parecem acalorar os debates entre os especialistas.

Em abril de 2007, o Grupo de Trabalho de Vacinas do Ministério da Saúde deu parecer contrário à incorporação dessa vacina ao Programa Nacional de Imunização, alegando alto custo e ausência de informações consistentes sobre a vacina, como a duração da imunidade conferida e a necessidade de vacinação de reforço. A proteção cruzada também tem sido discutida, já que as vacinas atuais parecem não conferir imunidade a outros subtipos de HPV: 30% dos casos de câncer de colo uterino podem estar relacionados aos HPVs 31, 33 e 58, não cobertos pelas vacinas. Além disso, uma campanha de vacinação relacionada a uma DST, direcionada a mulheres jovens e sexualmente inativas, pode ter pouca aceitação caso não venha acompanhada de muita informação sobre o HPV e sua relação com doenças graves.

Parece inegável que tais tópicos tenham sido objetos de bastante discussão, não só nas esferas públicas, mas também em congressos e entidades especializadas. Em termos técnicos, a vacina contra o HPV é segura e eficaz e, portanto, necessária. Do ponto de vista do contribuinte brasileiro, ela passa a ser um dever do Estado, já que este deve prover saúde a toda a população. Mas, da perspectiva do Ministério da Saúde, disponibilizar a vacina na rede pública requer um cálculo preciso: custos de tratamento com lesões associadas ao HPV versus o custo da vacina em rede nacional. Tendo em vista a conduta atual do poder público, o segundo fator desta conta parece estar se sobressaindo, e, assim, novas pesquisas serão necessárias para diminuir o custo até que a vacina seja disponibilizada na rede pública. Enquanto isso não acontece, milhares de mulheres brasileiras deverão, por conta própria, procurar proteção contra o vírus, por meio tanto da vacina no setor privado quanto da adoção de práticas sexuais seguras.

Texto retirado da Revista MedAtual

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